Por que o Auxílio Emergencial é tão importante? - INESC

Por que o Auxílio Emergencial é tão importante?

28/02/2021, às 19:11 (updated on 12/08/2025, às 11:02) | Tempo estimado de leitura: 8 min
Por Nathalie Beghin, Coordenadora da Assessoria Política do Inesc
Caixa Econômica paga o Auxílio Emergencial no valor de R$ 600,00 aos que pereram renda durante a crise do coronavírus (covid-190 .Sérgio Lima/Poder360 05.05.2020

O Auxílio Emergencial, criado pela Lei 13.982 de 2 de abril de 2020 como medida para enfrentamento das consequências da pandemia da Covid-19, distribuiu benefício monetário a cerca de 68 milhões de pessoas vivendo em situação de pobreza: foram cinco parcelas de R$ 600,00 e 4 parcelas de R$ 300,00 entre os meses de abril a dezembro de 2020.

São muitas as razões que justificam a manutenção do Auxílio Emergencial a R$ 600,00 até o final da pandemia da Covid-19. Vejo pelo menos quatro: conter a crise sanitária mantendo o distanciamento social, combater a pobreza extrema e a fome, diminuir as desigualdades, incluindo as desigualdades de gênero e raça, e injetar recursos na economia evitando o pior.

O Auxilio Emergencial contribuiu para conter a crise sanitária

O Brasil enfrenta neste mês de fevereiro de 2021 um momento dramático da crise sanitária decorrente da pandemia da Covid-19: segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) são mais de 253 mil óbitos associados ao crescimento da mortalidade e ao colapso do sistema de saúde. A falta de controle da disseminação do vírus é uma das mais importantes causas desse quadro. Estudos recentes têm demonstrado a centralidade do distanciamento social para diminuir a transmissão da doença. E mais: o expressivo aumento de casos e da mortalidade em decorrência do Sars-Cov-2 verificados nas últimas semanas é a mais dramática expressão do relaxamento dessas medidas desde o final de 2020.

Conter a crise sanitária mantendo o distanciamento social torna-se urgente. Pesquisa realizada em 241 regiões de 9 países da América Latina e na África mostrou que a pobreza está associada a maior mobilidade. Disso decorre que mais ajuda monetária é igual à mais isolamento, daí a importância do Auxilio Emergencial para manter as pessoas em casa.

O Auxilio Emergencial aliviou a fome

Dados produzidos pelo Ibre/FGV a partir da Pnad-Covid revelam que o Auxílio Emergencial no valor de R$ 600,00 por mês contribuiu para que a extrema pobreza no Brasil chegasse ao seu nível mais baixo da história recente, 2,3%. Como a maior parte dos recursos do Auxílio se destinou a compras de alimentos, o impacto desse programa na fome foi inegável.

O fim do benefício em dezembro de 2020 associado a uma economia que ainda não se recuperou da pandemia e à números de casos e mortes por Covid-19 em alta devem elevar a parcela de brasileiros vivendo em pobreza extrema a 10% a 15% da população, algo entre 21 milhões e 31 milhões de pessoas, segundo informações produzidas pelo Ibre/FGV.

Daí que espanta que o governo tenha deixado de gastar R$ 29 bilhões que foram autorizados, mas não executados em 2020. Esses recursos teriam possibilitado ampliar o número de beneficiários ou o valor do benefício, contribuindo ainda mais para diminuir a pobreza.

O Auxilio Emergencial diminuiu as desigualdades

Os benefícios do Auxílio Emergencial não param por aí. O programa contribui para diminuir as desigualdades de renda: ainda segundo o Ibre/FGV, o índice de Gini caiu mais de 3% entre maio e agosto de 2020.

As desigualdades regionais também encolheram. Prova disso, de acordo com cálculos do Ibre/FGV, é que após a redução registrada do Auxílio Emergencial em setembro, de R$ 600,00 para R$ 300,00, a pobreza extrema teve maior alta no Nordeste.

Outro impacto extremamente alvissareiro do Auxílio é ter resultado no combate as desigualdades de gênero e raça. Com efeito, estudo publicado pelo Made/USP mostra que no caso de domicílios chefiados por mulheres negras, o Auxilio Emergencial mais do que compensou a perda da renda do trabalho em decorrência da Covid-19. E mais: antes da pandemia a renda per capita dos domicílios chefiados por homens brancos era 2,5 vezes superior à renda per capita dos lares chefiados por mulheres negras. Com o Auxílio Emergencial, essa razão caiu para 2.

O encerramento do programa no final de 2020 irá resultar no aumento das desigualdades regionais, de gênero e raça.

O Auxilio Emergencial “segurou” a recessão econômica

Não fosse pelo Auxílio, que injetou mais de R$ 300 bilhões na economia, a recessão em 2020 teria sido muito maior. Análises do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da FEA/USP mostram que o tamanho do tombo estimado para o PIB brasileiro em 2020 seria da ordem de 8,4% a 14,8% e o Auxílio Emergencial não tivesse sido adotado. O dado oficial só será divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no início de março de 2021, mas as projeções convergem para uma queda em torno de 4,5% em relação a 2019.

Ou seja, se o Auxílio não tivesse sido adotado, mesmo no melhor dos casos (queda de 8,4% do PIB), a economia brasileira teria tido uma contração quase duas vezes maior que a observada no cenário com o Auxílio. No caso mais pessimista, que prevê retração de 14,8% da economia sem o programa, o tombo seria cerca de três vezes maior que o verificado na realidade.

O estudo confirma, portanto, que o Auxílio Emergencial impediu uma recessão ainda mais profunda no Brasil em 2020.

Prorrogar o Auxílio Emergencial até o fim da pandemia é urgente e necessário

Por todas essas razões, urge prorrogar o Auxílio Emergencial no valor de R$ 600,00 por mês até quando o país consiga debelar a pandemia. De imediato, é inadiável decretar novamente a Calamidade Pública para que o orçamento fique liberado das suas amarras e emitir créditos extraordinários para custear o programa. Para outorgar maior sustentabilidade ao gasto, o Congresso Nacional deve aprovar uma reforma tributária que taxe os super ricos assim como votar medidas que tornem nosso sistema tributário mais justo e progressivo. Deve, ainda, acabar com o Teto de Gastos, pois as consequências econômicas e sociais da pandemia ainda irão perdurar por um bom tempo. Cabe ao Congresso mostrar ao povo brasileiro seu compromisso com a justiça e, para tal, estabelecer regras fiscais que se subordinem aos direitos humanos, à estabilização do ciclo econômico e à viabilização do aumento dos investimentos públicos destinados à resolução das nossas inúmeras carências sociais e ambientais.

 

Crédito da foto: Sérgio Lima

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Marcha das Mulheres Negras coloca 300 mil nas ruas por Reparação e Bem Viver

26/11/2025, às 14:40 (updated on 26/11/2025, às 14:44) | Tempo estimado de leitura: 6 min
Organizações feministas negras e aliadas da sociedade civil, entre elas o Inesc, participaram ativamente da construção da Marcha e reforçam que reparação é condição essencial para um país mais justo.

Centenas de caravanas vindas de todas as regiões do Brasil, além de países da América Latina, Caribe e países africanos, ocuparam Brasília nesta quinta-feira (25) para a 2ª Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver. A estimativa é de que cerca de 300 mil pessoas tenham tomado a Esplanada dos Ministérios em um dos maiores atos de mobilização de mulheres negras da história recente.

Com cantos, palavras de ordem e uma força coletiva pulsante, as marchantes reafirmaram o papel central das mulheres negras na construção do país. “Nós ocupamos a capital federal para dizer para a sociedade racista,  sexista e capitalista que somos 28% da população brasileira e que nada neste país será sem nós”, declarou Cristiane Ribeiro, do colegiado de gestão do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos). 

Reparação como fundamento para o futuro

A Marcha deste ano destacou que não há reparação sem memória. O reconhecimento dos danos estruturais gerados pela colonização e pela escravização, assim como dos lucros acumulados por séculos de exploração, foi apontado como passo indispensável para a construção de uma sociedade democrática e verdadeiramente igualitária.

O Brasil, maior país negro fora da África e último das Américas a abolir formalmente a escravidão, segue atrasado na adoção de medidas de justiça reparatória. “Reparar, então, é pressuposto básico e indispensável para a construção da sociedade de Bem Viver, este que é o nosso paradigma utópico, mas sobretudo nosso farol para marcharmos em direção ao futuro que desejamos para todas as pessoas”, afirma o manifesto da Marcha.

Inesc na construção da Marcha

O Inesc esteve presente em todo o processo de construção da 2ª Marcha das Mulheres Negras, contribuindo politicamente e institucionalmente para sua realização.

“Marchamos juntas por reparação social, econômica e política. O Inesc está em marcha nesse movimento que não é apenas um dia nas ruas, mas um processo contínuo de transformação social”, destacou Cristiane.

Para contribuir com o debate técnico e político, o Inesc apresentou e distribuiu o guia “Desigualdade no Bolso – Justiça Fiscal para Mulheres Brasileiras”, durante a atividade “Diálogos Globais por Reparação e Bem Viver”, realizada na Universidade Federal de Brasília entre os dias 22 e 24 de novembro.  

Organizado pelo Comitê Impulsor Global da Marcha, o evento reuniu mais de 100 mulheres negras de diversas partes do mundo. “O guia produzido pelo Inesc examina as desigualdades de gênero e raça no sistema tributário brasileiro e propõe reformas para promover justiça fiscal”, relatou Cristiane. De acordo com ela, cinco são as mensagens principais: (i) O sistema tributário brasileiro é regressivo e penaliza especialmente as mulheres negras; (ii) cortes de gastos públicos perpetuam a submissão econômica das mulheres na sociedade; (iii) a reforma tributária trouxe avanços, mas ainda precisa garantir conquistas específicas para as mulheres; (iv) muitas renúncias fiscais brasileiras beneficiam elites econômicas, como o setor financeiro, o agronegócio e a mineração, em detrimento das mulheres; (v) é necessário repensar a economia com foco na justiça social, racial e de gênero.

Para apoiar a realização da Marcha, o Inesc firmou parceria com a Secretaria de Justiça e Cidadania do Distrito Federal (Sejus), por meio do Termo de Fomento nº 11/2025. Uma das ações estruturantes do projeto foi a realização da Feira de Empreendedoras Negras (Feira das Ganhadeiras), que reuniu mulheres de todas as regiões do Brasil para promover visibilidade, geração de renda, circulação de saberes e valorização da economia criativa.

“Essa parceria reforça nosso compromisso com a luta das mulheres negras, que seguem apontando caminhos para um país mais justo, igualitário e plural”, sublinhou.

O Inesc também apoiou a participação de lideranças com as quais trabalha nos projetos executados pelo Instituto, entre eles, o Mulheres Amazônidas, mulheres negras impactadas pela mineração no Pará, além de adolescentes e jovens do Distrito Federal participantes do Malala, Mapa das Desigualdades e Grito das Periferias.

A 2ª Marcha das Mulheres Negras deixa sua marca na história ao reafirmar que a luta por Reparação Histórica e Bem Viver segue viva — e conduzida por quem há séculos sustenta o país.

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